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sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

O Chapéu


Os imigrantes italianos começaram a chegar ao Brasil a partir de 1870
Oscar Neyro aproveitando o momento em que não havia mais ninguém, além do proprietário, no bar do Bafão, naquela manhã de sábado, entrou detonando:

- Verme do inferno! Manda aquela pinga esperta e a cerveja mais bem gelada que você já viu.

Bafão que lavava alguns copos na pia, com a costa voltada para o balcão, virou-se sobre o ombro direito e olhando de baixo para cima, mirou a presença marcante do roliço Oscar Neyro, o mais novo morador da Vila Dependência.

Tirando do ombro esquerdo o guardanapo com o qual enxugou as mãos, o proprietário do boteco pôs sobre o balcão o copo específico de aguardente, enchendo-o com a tal filha-do-senhor-do-engenho.

No momento em que Oscar emborcava a caninha, Bafão servia-lhe a cerveja geladíssima. Foi nesse instante que adentrou ao recinto a mais bela e cobiçada morena de olhos verdes, das curvas perfeitas, e das coxas vistosíssimas do quarteirão. Era Aline, a solteira exuberante que inibia, de certa forma, a moçada do bairro, com aquele seu jeito extrovertido.

- Seu Bafão, eu quero um litro de leite, dois filões, e meio quilo de pó de café – disse a bela, com o dedo indicador da mão direita em riste, acima da cabeça. Ajeitando depois o short preto, semi-encoberto pela camiseta verde, e juntando os pezinhos, calçados com o legítimo All Star preto, ela esperou.

Oscar Neyro, boquiaberto, pousou seu olhar sobre a moça, mas antes que pudesse expressar qualquer juízo de valor foi interrompido pelo vozeirão do comerciante que passava, envoltos num saco plástico, sobre o tampo do balcão, os produtos pedidos pela consumidora.

- Marca isso tudo na minha conta. O senhor já sabe né? No fim do mês a gente acerta – concluiu a jovem saindo do boteco.

Ao voltar-se para a pia, onde continuaria lavando os copos, Bafão notou a entrada de outra moça também de short, chinelos, camiseta vermelha e preta sem mangas, e decote cavado.

- Meu Bafinho querido: embrulha um desodorante, um sabonete e aquela pasta dental esperta. Quero ainda dois filões e 160 gramas de mortadela. Faça-me esse favor, queridinho – pediu com gentileza a loura Débora, dona também dos mais vistosos olhos esverdeados da redondeza.

Oscar Neyro só olhava; ele mantinha o copo suspenso entre o tampo do balcão e os lábios.

Pedindo que Bafão anotasse a dívida num caderninho, a moça deixou o bar, balançando os quadris ostentosos.

Antes que Oscar dissesse qualquer palavra, fizesse algum comentário ou risse da situação, Bafão explanou:

- Nem pense bobagem. As duas são casadas. Você se lembra do Sylvester Stalonge? Pois é. Entrou numa fria lamentável. Engraçou-se com a mulher do Luis Hernandes e o casal teve de se separar. Do Luis você se lembra, não é? – indagou Bafão percebendo que Neyro já não prestava tanta atenção no assunto.

Diante da afirmativa do cliente, Bafão prosseguiu:

- O negro Luis Hernandes foi contratado pelo Sylvester Stalonge como desossador oficial do açougue que ele – o Stalonge – havia acabado de instalar. Depois de seis meses, mais ou menos, Hernandes começou a falhar no serviço. Vinha um dia, mas faltava outros três. Essa situação continuou até o momento em que Sylvester Stalonge, de surpresa, fez uma visita ao empregado. O dono do açougue foi recebido pela mulher do Hernandes, que informou estar o marido dominado pela bebida e sem condições de continuar no emprego. Bom, - pra encurtar a história -, papo vai, papo vem, o Stalonge “traçou” a mulher do Hernandes.

Ante a face de espanto demonstrada pelo já embriagado Oscar Neyro, Bafão prosseguiu:

- Olha, meu amigo, a confusão foi tanta, a quizumba tamanha que não principiaram uma revolta militar, um motim destruidor, ou terremoto, por pouco, muito pouco, pouco mesmo. Você não acredita, mas até há algum tempo, o Sylvester Stalonge sentia os efeitos da mancada que deu.

- Como assim? – inquiriu Oscar Neyro.

- Você sabe como é esse pessoal: eles misturam tudo. Confundindo Luis com luz, fizeram o pobre Stalonge ter problemas na Companhia Tupinambiquence de Força e Luz até o ano passado. O sujeito levou cada choque elétrico que deu medo. O fornecimento de energia das suas casas foi cortado várias vezes, durante anos seguidos. Seus aparelhos não duravam muito tempo; queimavam-se com facilidade. E olha que a “trairagem” aconteceu há mais de 30 anos.

- Impressionante – admirou-se Oscar.

- Você não acredita, mas fizeram circular um boato que os bisavôs do Sylvester, que imigraram da França em 1.870, não pagaram nem o “chapéu”, e que ele, o bisneto, deveria ser condenado por isso.

Bastante curioso, Oscar Neyro perguntou:

- Chapéu? Que história é essa?

- Você não sabe? Ora, “chapéu” era a gratificação que o armador, dono do navio, pagava ao capitão, quando este chegava a salvo no destino. O valor do prêmio era coletado entre os passageiros.

Enquanto Bafão voltava a lavar os copos e Neyro sorvia o último gole de cerveja, Debora entrou novamente no bar.

- Estou tão sozinha, neste sábado gostoso... Bafão, querido, meu xampu favorito você sabe qual é – lançou a moça revolvendo os cabelos que lhe encobriam a nuca.

Ao entregar a mercadoria para a freguesa, Bafão olhou para Oscar Neyro e murmurou:

- Vai nessa?



Texto revisado em 24/02/2011.

Atenção:

Qualquer semelhança de nomes, pessoas, ou situações terá sido mera coincidência.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

O Balanço das Ondas

Esteve tudo muito bom, a alegria pairou no ar, o som romântico estava ótimo, mas durante a noite, quando imperava o silêncio e o vento trazia os odores do mar, eu senti que algo a mais poderia ser acrescentado.

Não me preocupei com o efeito da bebida, pois não havia ingerido tanto. Notei que os sapatos novos deram um aspecto bem diferente à silhueta dos pés e que agora, ali na cama, descalça, o conforto se impunha de forma completa.

O coração batia forte e ritmado. Não seriam algumas lembranças tristes que dominariam o restante da madrugada.

Notei que passou ao largo, e bem rápida, a frota das emoções negativas, que teimava com aqueles assédios maldosos e frustrados.

Voos livres rasantes de pessimismo, incompreensão e má vontade, foram percebidos a princípio, mas logo se diluíram sob o clarão do céu noturno.

Ao fundo, o ruído das máquinas impunha lampejos dos grandes bondes, que faziam trepidar o chão, no entorno dos trilhos, por onde passavam.

Faltou algo, não sei bem o que era. Talvez fossem melhores contatos, afagos, palavras simples de admiração, respeito ou louvação.

Ou seria o recrudescimento do atual, porém imperceptível balanço das ondas?

Vi a nau se aproximar de forma lenta, mas segura, do porto. O celular transmitia a certeza de que tudo estava bem, com o futuro que nos aguardava.

Foi ótimo o passeio. Gostei.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Os Bailes de Carnaval

Jorge sentia-se estranho naquela cidade. Ele viera para uma festa de aniversário da prima Helen que o recebera muito bem na manhã do dia anterior.

O rapaz caminhava só pela calçada ruminando os bons momentos da festa que tivera muita gente, flash e animação.

Ele não dormira bem à noite por causa do excesso de bebida, mas, mesmo assim ao acordar, naquela manhã de terça-feira, resolveu andar pelo calçadão da orla. O sol aquecia bastante, despontado no céu límpido.

- Por que a Helen não fez a festa no final de semana? – perguntava Jorge num solilóquio discreto, enquanto observava, através das lentes dos seus óculos de sol, algumas pessoas que se divertiam nas ondas verdes.

O turista andava distraído e surpreendeu-se quando alguém ao se aproximar por trás disse:

- Ei Jorge, já cedo assim acordado? Não passou bem durante a madrugada? – Era o empresário Cristiano que também participara das comemorações do décimo nono aniversário da Helen. Ele vinha no mesmo sentido caminhando mais rápido.

- Ah, oi, como vai? – respondeu Jorge ao voltar-se – Eu bebi muito. A ressaca é enorme. Não passei bem o resto da noite, mas logo melhoro – concluiu.

- Achei esquisito a Helen desperdiçar o sábado e o domingo pra fazer a festa. Ela escolheu justamente a noite de segunda-feira. Não é estranho? – indagou Cristiano ajustando a velocidade dos seus passos a dos de Jorge.

- É, gente rica tem suas manias - explicou o turista. – E depois, levantando a pala do boné vermelho: - Mas como tem gente bonita nesta praia hein? Veja como as mulheres caminham harmoniosamente. Parece que desfilam naquelas passarelas.

- Sim, tem muita gente sarada e bela por aqui – resumiu Cristiano percebendo o suor que lhe empapava a camiseta - Vamos caminhar mais rápido?

Os dois homens seguiram céleres pelo calçadão quando avistaram um gorducho que, de short amarelo, camiseta preta, boné verde e chinelos brancos, arrastava uma mala preta enorme ao atravessar a avenida em direção à praia.

- Veja só aquela figura! – assustou-se Cristiano chamando a atenção do companheiro – não é o Leonel?

- Não conheço nenhum Leonel – respondeu Jorge desviando-se de um esqueitista, que saíra sem querer, da ciclovia.

- Você não imagina o que esse cara aprontou num baile de carnaval no ano passado. Meu amigo, que vergonha! Que vexame – enfatizou Cristiano.

- Nossa! Foi tão grave assim? – quis saber o amigo.

- O sujeito chegou cedo ao salão, bebeu todas e mais algumas, depois no meio daquele povo todo, começou a passar a mão na busanfa da mulherada.

- E ai? Deram-lhe um cacete? – indagou Jorge.

- Botaram o cara pra fora do baile. Ficou deitado na calçada de tão bêbado que estava. Mas pode uma coisa dessas?

- Pô, mano, que papelão! – concordou o turista.

- E, olha, não foi aquela a primeira e a única vez, não. Houve outra, no mesmo esquema. No baile dos periquitos, ele mandou ver a mão boba nas coxas do mulherio. Parece que o sujeito não pode beber.

- O pessoal instiga e ele entra de gaiato. Na verdade é um panaca, um palhaço – arriscou Jorge com a sua análise.

O calor aumentava por volta das onze horas. Eles haviam chegado defronte ao prédio da Helen.

- Quando você volta pra casa? – indagou Cristiano.

- Talvez amanhã à noite – respondeu Jorge num tom de despedida.

- Tem ainda muitas compras pra fazer? – brincou Cristiano afastando-se.

- É, meu amigo, a vida tem dessas dificuldades também – concluiu Jorge com ironia, entrando no edifício.

02/02/11

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sexta-feira, 21 de maio de 2010

Os passeios de Stela

Stela tem algo de rodriguiano que a identificaria com aquela personagem buscadora do equilíbrio nas aventuras extraconjugais.

Apesar do fausto material que a cerca, ela não obteria o bem estar se não se dispusesse a dar seus “pulinhos”, não nos ônibus, ou lugares ermos, mas nos hotéis de luxo.

Esse comportamento de Stela tem muito de vingativo, de punidor. Ao invés de digamos, “discutir a relação” com o marido, terminando de vez o relacionamento conflituoso, ela se compensaria nas incursões amorosas.

O desejo de manter a família unida a impediria de separar-se. Para ela a coesão familiar, mesmo que não satisfatória, teria mais importância.

Se impedida ao acesso dessa válvula de escape o que lhe restaria? Uma neurose, agressividade, hostilização, terapias, divórcio?

O adultério serviria para aquietar momentaneamente a exaltação dos ânimos. Porém com o passar do tempo as consequências se apresentariam de forma talvez até que mais trágicas.

Nas aventuras em que se envolve ela não se compromete: não diz seu nome e nem quer saber o dos parceiros casuais. Stela vive a vida.



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quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Estendendo a canga

- Então é assim, você sintetiza o comissionamento recebido e depois propõe a distribuição a quem de direito. Não podemos acreditar que haja desvirtuamento daqueles princípios propostos. Existem pessoas que crêem nisso. Eles acham que haveria um desvio compensatório. Eu ligarei mais tarde pra confirmar. Mas mesmo assim acho que nada saberemos sobre a verdade. Não há provas nem jeito de flagrar o crime.

Jorge, com lentidão, encaixou o fone no antiquado aparelho telefônico que estava sobre a mesa do escritório. O vermelho já um tanto desbotado não servia de argumento convincente que o levasse a trocar a peça. “Não sei por que você se liga tanto nessas velharias. Existem tecnologias novas no mercado e você não se interessa” – ele recordou-se do que dissera Consuelo. A mulher vivia ao seu lado há quarenta anos.

O homem caminhou até a cozinha quando então ouviu a voz da criança vinda do apartamento vizinho. Ela balbuciava algumas palavras dirigidas à mãe. Uma sensação esquisita apertou o peito de Jorge. “Que ela tivesse cuidado e ofertasse proteção aos filhos. Afinal, havia mães que não imaginavam a possibilidade de estarem seus pequenos, sujeitos ao ódio, que alguns adultos frustrados, não conseguiam descontar nos desafetos”.

Depois de espremer um limão na água, que tirara da geladeira, ele voltou-se para a sala. Os móveis antigos, mas bem conservados, eram de um tempo em que as cristaleiras significavam destaque entre o pessoal da vizinhança.

Segurando ainda o copo de limonada ele se aproximou da réplica do quadro o Grito do Ipiranga de Pedro Américo, que ornava a parede. Apesar do desbotado da figura, ela ainda mantinha os traços que lembravam aquele momento histórico.

Vestido com seu robe-de-chambre azul pavão felpudo, ele se movimentou pela sala podendo observar a mesa estilo colonial, ainda bem conservada. Uma onda de nostalgia tomou-lhe a consciência e ele viu-se ainda criança quando o pai, no meio daqueles rascunhos, desenhos e projetos, tentava ordenar as plantas do iate que tencionava construir.

Réguas, compassos, esquadros e lapiseiras eram as ferramentas que ele manipulava com maestria. Jorge lembrou-se de que quando o pai notava sua presença, ao lado da prancheta, dizia-lhe palavras de carinho.

- A espera. A espera pode ser agoniante, mas inevitável.

O homem caminhou pela sala e notou o sofá que, ao lado da janela aberta, acumulava alguma poeira vinda de fora. Com um gesto delicado ele a fechou. Era perigoso mantê-la aberta nesses tempos em que os pássaros ainda voejavam sem muita direção.

- Já imaginou – disse ele em voz baixa – se um urubu atordoado entra por essa janela adentro despedaçando as coisas? Misericórdia!

Num vaso pequeno Consuelo conservava a muda de acerola que desejava ver desenvolvida no pomar da chácara. Além dessa planta havia também um arbusto de limão. A ida àquele local, quase nunca visitado, excitava-o e, sua impaciência era comunicada pelo jeito com que caminhava pisando firme no soalho, desviando-se dos móveis.

- Olha o vizinho de baixo! Pisa leve, se não já viu né? – esgoelara Consuelo que manipulava, na lavanderia, a velha máquina de lavar roupas.

- Mas será o Benedito? Não vejo a hora de ir para o sítio. Careço de agir com mais liberdade, sem tanto receio de ver gente que se mostra magoada por coisas insignificantes. – Jorge notava que seu rosto enrubescia.

- Pra você escrever censura com “s” não tem problema. Mas pra essa gente cheia de “nove horas” o caso é sério. – ponderou Consuelo.

- Tudo bem, mas não precisava fazer essa onda toda, esse estardalhaço. Por que essa “tolerância zero”? – O tom de voz de Jorge dava a impressão que ele explodiria.

- Deixa de ser maçante, homem de Deus! Para de se preocupar à toa. Vai caminhar um pouco, respirar ar puro. Ô nego chato, seu! - Consuelo falava ao mesmo tempo em que batia, com vigor, a calça jeans no escorredor do tanque.

Jorge ouviu o que esperava. Ele tirou rapidamente o roupão, vestiu a bermuda preta que combinou com a camiseta vermelha e, calçando os chinelos de tiras preto e branco, saiu mais uma vez para caminhar. Ele tinha certeza que encontraria a natureza bela, do jeito que sempre fora.

Fernando Zocca.





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